Na busca pelo emagrecimento ou pelo melhor desempenho esportivo, nem sempre é fácil escolher a melhor dieta. Isso acontece porque não há fórmula mágica, sendo necessária uma avaliação individualizada com um nutricionista e, em alguns casos, outros profissionais, como médico endocrinologista. Atualmente, muito se fala a respeito do jejum intermitente, padrão alimentar que consiste em permanecer períodos prolongados de tempo com pouca ou nenhuma ingestão energética (por exemplo, 12h a 48h), alternando com períodos de ingestão alimentar normal, a chamada janela alimentar. Mas e para quem se exercita, o jejum pode afetar a performance esportiva? De acordo com o nutricionista esportivo Bruno Nogueira e o médico do esporte Ricardo Oliveira, depende. Os reflexos no desempenho podem variar de indivíduo para indivíduo, destacando fatores como nível de treinamento e condições médicas.
“Os dados científicos em relação ao jejum e à performance esportiva são controversos. Existem estudos que não encontraram piora de rendimento, como pesquisas envolvendo atletas muçulmanos durante o mês sagrado do Ramadã. Por outro lado, alguns estudos apontam uma queda de performance. Na prática clínica, é exatamente isso que vemos. Alguns pacientes referem perda de performance enquanto outros não”, aponta o médico do esporte.
Na hora de avaliar se há queda ou melhora no desempenho esportivo, é preciso individualizar a análise. Afinal, cada pessoa tem um estilo de vida, um objetivo e um histórico médico próprio. Mas é possível conciliar o jejum intermitente com o treinamento? De acordo com Bruno Nogueira, é possível desde que a dieta seguida após do período em jejum supra as necessidades do indivíduo.
“A prática de conciliar o jejum com o treinamento atua diretamente no quadro hormonal, diminuindo a insulina e aumentando o glucagon, o GH, o cortisol, a epinefrina e a norepinefrina. Indivíduos treinados têm boa liberação desses hormônios para conseguirem treinar bem, porém, indivíduos destreinados ou fora de forma não têm boa liberação destes hormônios para realizar um bom treino. Além disso, devemos avaliar a individualidade de cada um: pessoas que sofrem ansiedade não devem fazer jejum, esses hormônios contribuem para a piora do quadro de ansiedade. Portanto, pode sim afetar a performance, pois pode depletar os estoques de glicogênio muscular (estoque de glicose no músculo e principal fonte de energia) diminuindo a performance. Atletas de alto desempenho treinam por longos períodos, fazer jejum com uma rotina intensa de treinamentos vai acabar com a performance, é a mesma coisa de querer acelerar uma Ferrari sem gasolina”, explica o nutricionista esportivo.
Impactos positivos
Como impactos positivos de treinar em jejum, os especialistas destacam:
- A maior atuação do sistema simpático, que é o sistema que nos deixa mais alerta, colocando o corpo em estado de luta ou fuga;
- A possibilidade de melhorar a sensibilidade à insulina, mas vale ressaltar que isso depende de outros fatores, como treinamento e alimentação;
- A possibilidade de o corpo ser “treinado” para utilizar seus estoques de gordura como fonte de energia, o que poderia se traduzir em alguma vantagem durante provas de longa duração, onde a utilização de gordura como fonte de energia se faz necessária.
Impactos negativos
Já em relação aos impactos negativos de treinar em jejum, Bruno destaca que, quando se trata de atletas, é preciso sempre trabalhar a favor da performance, isso é, prescrever a dieta mais adequada possível rica em carboidratos, com quantidade calculada para o tempo de treinamento de cada indivíduo, com a finalidade de garantir os estoques de glicogênio para a atividade.
No caso de se exercitar em jejum, sobretudo em atividades de moderada ou de alta intensidade, o nutricionista aponta que os estoques ficam comprometidos, pois o corpo utiliza o substrato energético (“combustível”) disponível sem ter realizado um estoque para a atividade, o que pode levar à fadiga ou exaustão muito mais rápido, além de aumentar o risco de hipoglicemia durante o exercício. Portanto, em uma situação na qual existe depleção de glicogênio, como é o caso de jejum, a performance esportiva pode ser reduzida.
Cuidados ao se exercitar em jejum
Segundo o médico do esporte Ricardo Oliveira, para aqueles que já fazem exercício em jejum e se sentem bem, não há motivo para modificar a rotina. Entretanto, para aqueles que desejam iniciar tal prática, sugere-se uma avaliação médico-nutricional inicial, assim como progressão gradual de intensidade e volume de treinamento, de acordo com capacidade física e tolerância individuais.
Quando treinar em jejum não é indicado?
“Recomenda-se que pessoas destreinadas ou pouco treinadas não pratiquem atividades físicas em jejum nem conciliem o jejum intermitente com os exercícios. Essas pessoas têm menos capacidade de adaptação para conseguirem treinar com baixos estoques de energia, podendo ter hipoglicemia e até desmaios. O preparo vem com o tempo, aumentar o treinamento e seguir uma dieta adequada vai ajudar, com alguns anos de treinamento a adaptação fica mais fácil. A recomendação para quem quer iniciar é fazer testes e ver como é o desempenho e quais os colaterais sentidos com o treinamento em jejum. Treinamento em jejum jamais deverá ser feito por portadores de diabetes ou pessoas que tem hipoglicemia”, frisa o nutricionista esportivo.
Em relação a quanto tempo é recomendado conciliar essa prática com o treinamento e se há um limite, o profissional responde que a melhor pessoa para avaliar os benefícios e os colaterais advindos dessa prática é o próprio indivíduo que realiza o jejum. Afinal, a avaliação do desempenho no treinamento, do sono, se consegue seguir a dieta ou se tem compulsão alimentar e também se sente dores de cabeça só poderá ser feita pelo próprio indivíduo. A recomendação de Bruno é que a pessoa siga essa prática por até 60 dias, mas existem pessoas que se adaptam bem e permanecem por muito mais tempo.