Pesquisadores da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), na Zona Norte do Recife, lideram, no Brasil, um estudo internacional que utiliza cães para identificar de forma precoce a Covid-19 pelo cheiro do doente. A equipe pretende comprovar que os cachorros treinados têm capacidade para distinguir a diferença do odor de um infectado do exalado por uma pessoa sem a doença provocada pelo novo coronavírus.
A pesquisa está sendo realizada com a Escola Nacional Veterinária de Alfort, na França. O estudo tem três fases distintas, sendo que a última prevê o uso dos cães para detectar a Covid-19 em locais com grande aglomeração de pessoas, como shoppings, teatros e shows.
A iniciativa integra o Projeto Internacional Nosaïs. Estão sendo usados cães da instituição Amarante do Brasil, que financia o material e treina os animais. O treinamento dos cachorros é realizado pelo instrutor Jorge Pereira.
“Essa pesquisa foi aprovada por conselhos de ética que atuam em estudos com animais e humanos”, informou, nesta quarta-feira (12), o biólogo Anísio Francisco Soares, coordenador da pesquisa na Rural de Pernambuco.
Em Pernambuco, a UFRPE conta com o apoio da Secretaria de Saúde de Paudalho, na Zona da Mata Norte, distante 40 quilômetros do Recife. O município disponibilizou equipes para fazer a coleta de voluntários que apresentaram sintomas de síndrome respiratória.
“Fomos procurados em abril pela instituição francesa. Começamos a coletar material e enviamos para São Paulo. Lá, os animais treinados mostraram que são capazes de reconhecer o cheiro do suor de uma pessoa com a Covid-19, que é diferente de quem não tem a doença”, disse o professor Anísio Soares.
Segundo ele, a primeira fase, em andamento, consiste na coleta de material e deve seguir até setembro. Soares conta que as pessoas são procuradas pelos agentes de saúde para o recolhimento de secreções, por meio do teste RT-PCR, aquele em que se usa uma espécie de cotonete, e para o armazenamento do suor.
A amostra de secreções é importante para mostrar quem tem e quem não tem sintomas. No caso do suor, são usados chumaços de algodão para fazer a coleta das axilas da pessoa.
“O coronavírus não tem cheio, mas a pessoa infectada exala um suor com características específicas. Nós chamamos de biomarcadores moleculares. Para fazer o armazenamento, a pessoa fica 20 minutos com o algodão embaixo dos braços”, informou.
Até esta quarta, a equipe da Rural tinha conseguido coletar 100 amostras de chumaços de algodão. Uma parte ficou no Recife e a outra seguiu para uma instituição em São Paulo, onde estão os cães farejadores.
“Os cães passam na frente das amostras, que são numeradas, em caso de detectar o cheiro característico, são treinados para sentar e esperar um brinde. “E possível mostrar que eles conseguem fazer isso”, comentou.
A pesquisa segue em laboratórios dos Departamentos de Morfologia e Fisiologia Animal (DMFA) e Medicina Veterinária (DMV) da UFRPE. Nesses locais, os pesquisadores identificam os biomarcadores, ou seja, as moléculas que estão presentes na reação do vírus com a sudorese humana.
Isso é feito por meio de cromatografia gasosa e HPLC, além de tecnologia sofisticada e precisa que está sendo utilizada em estudo semelhante na França.
Outras fases
Ainda de acordo com Soares, a segunda etapa da pesquisa prevê a atuação de dois cães em Paudalho. A ideia é testar as pessoas em salas monitoradas, fazendo com que os animais farejem o odor diretamente nas pessoas.
“Nessa etapa, será preciso seguir um protocolo específico. A pessoa com síndrome gripal deverá se apresentar sem poder tomar banho por 24 horas e sem usar desodorante. Vamos mostrar que os cães conseguirão detectar o cheiro. A contraprova da identificação feita pelo cão poderá ser confirmada dois dias depois, com o resultado da RT-PCR”, acrescentou.
Na fase três, disse coordenador da pesquisa, a ideia é levar os animais para locais com aglomeração para testar as pessoas e evitar a disseminação do novo coronavírus.
Para o professor Soares, isso será importante em um momento em que se está reduzindo o isolamento social, para proteger ambientes com grande circulação de pessoas.
“Assim que os cães, devidamente treinados, identificarem essas pessoas, elas serão notificadas e encaminhadas para isolamento social ou tratamento, evitando, assim, novas ondas de pico da doença. É um trabalho semelhante ao que ocorre em aeroportos, na detecção de entorpecentes e explosivos, além de doenças como malária e câncer”, ressaltou.
Segundo o pesquisador, a partir dessa iniciativa, será possível facilitar a triagem dos viajantes portadores da doença nos postos de fronteira, portos, rodoviárias e aeroportos, e auxiliar na retomada segura das atividades profissionais.
Além disso, será possível viabilizar a pré-testagem de um grande número de pessoas, com o objetivo de testar convencionalmente apenas aqueles indivíduos que são positivos a esse pré-teste, economizando material e tempo. De acordo com os treinadores da Amarante, os cães podem testar até 500 pessoas por hora.
Além do professor Anísio Soares, que tem doutorado em ciências biológicas e atua na área de fisiologia, a equipe da UFRPE conta com mais três cientistas.
São eles: professora Rita Maia, veterinária com doutorado em microbiologia e atua na área de virologia, e Leucio Alves, veterinário com doutorado em medicina veterinária, das área de parasitologia, além da professora Jeine Silva, veterinária com doutorado em biociência animal, na área de morfofisiologia.
Fonte: G1.globo.com (leia a matéria completa)