Quem deseja perderpeso sabe que o caminho não é fácil. As alternativas variam entre medidas voltadas à prática de atividades físicas, dietas convencionais e até mesmo a restrição alimentar. Uma dessas opções, que encontra adeptos de um lado e céticos de outro, é justamente o jejum intermitente, um tipo de plano alimentar que envolve períodos de jejum, durante os quais você pode consumir apenas água, café e chá, e outros em que se pode comer. Como no método 16/8, que significa realizar um jejum de 16 horas – podendo só beber água e chás – e então se alimentar dentro de uma janela de 8 horas.
Geralmente, é comum fazer o jejum intermitente de uma a duas vezes na semana para não haver perda de massa magra. Por ser um método de emagrecimento que visa intercalar períodos de jejum com períodos de alimentação, o objetivo é fazer com que o corpo utilize os estoques de gordura e, consequentemente, haja uma perda de massa gorda. No entanto, a nutricionista Luna Azevedo aponta que o processo tem implicações no nosso corpo que vão muito além da perda de peso, sendo necessária a ponderação na escolha dos alimentos, além do acompanhamento profissional necessário antes de começar o jejum. É fundamental sua adequação de acordo com o biotipo da pessoa, as condições de saúde e os plano de treinos, sempre respeitando a ingestão adequada de calorias, nutrientes e a hidratação.
“Apesar de poder ser adotado pela maioria das pessoas, eu diria que ele (jejum intermitente) tem públicos-alvos, como é o caso de pessoas com sobrepeso ou obesidade. Nestes exemplos, o jejum pode ser um método eficaz para promover a perda de peso devido às adaptações moleculares e metabólicas que a restrição calórica gera. No entanto, na outra ponta, ele deve ser evitado por alguns grupos como grávidas, nutrizes, mulheres que estejam tentando engravidar (tentantes), crianças, adolescentes em fase de crescimento, pessoas imunodeprimidas, desnutridas/baixo peso e idosos acima de 70 anos, pois se encontram em estágios de vulnerabilidade, demandando cuidado especial com condutas nutricionais específicas”, afirma Luna Azevedo.
A redução drástica na ingestão diária de calorias e a prática de períodos de privação no consumo de alimentos, assim como seu impacto no corpo, é um dos temas que mais intrigam cientistas. Foi inclusive motivo para o prêmio Nobel de medicina dado a Yoshinori Ohsumi em 2016, quando o biólogo especialista em biologia celular descobriu que a redução e a privação de alimentos pode ser capaz de ativar mecanismos de autodefesa das células. Esse processo, chamado autofagia, passa a atuar como uma espécie de autolimpeza na qual as células que não estão funcionando bem ou têm algum dano são “comidas” e eliminadas, resultando numa renovação no corpo. Ou seja, o jejum provoca uma faxina no nosso corpo que nos faz viver mais e melhor, mas isso tudo só é possível, claro, se adotado junto a um menu saudável, porque o que o faz emagrecer com qualidade não é o jejum em si, mas o que você coloca ou não no prato ao se alimentar.
Como funciona
Não existe um padrão para o estilo do jejum intermitente, mas sim alternativas que podem ser adaptadas à sua rotina. Enquanto alguns jejuns têm como meta o controle diário, como, por exemplo, no caso do protocolo 14/10, semelhante ao método 16/8, onde você jejua por 14 horas e pode comer durante 10 horas, facilitando o acompanhamento; outros atuam num planejamento mais extenso, como no método 5/2, onde a pessoa come apenas 500 a 600 calorias em dois dias não seguidos, e volta à alimentação normal nos outros cinco dias. Outro protocolo bastante utilizado é conhecido como Coma-Pare-Coma, no qual a pessoa escolhe um ou dois dias da semana em que ficará completamente de jejum; portanto, nestes dias, ela fará uma refeição e depois só comerá de novo no mesmo horário no dia seguinte. Por ser o mais restritivo dos métodos, a adaptação costuma ser mais difícil e, por isso, é fundamental a realização de refeições ricas em fibras antes do jejum.
É sempre importante lembrar que esse método de emagrecimento é indicado principalmente para quem já tem hábitos alimentares saudáveis e está acostumado a tomar chás e comer verduras e frutas, sem nenhum tipo de compulsão alimentar, porque mesmo sob longos períodos sem a ingestão de calorias, existe a possibilidade do objetivo alcançado ser o oposto do desejado, ou seja, o ganho de peso. Luna Azevedo diz que isso pode ocorrer devido a opção do indivíduo, após o período de jejum, por consumir alimentos poucos saudáveis e muitas vezes em excesso, como ultraprocessados (balas, salgadinhos, biscoitos de pacote, fast foods) que são ricos em calorias, açúcares, aditivos, gorduras, sódio, e que acabam por promover o ganho de peso, a médio-longo prazo.
“É muito comum a pessoa manter-se no jejum intermitente durante a semana, independentemente do tipo de protocolo adotado, e ao chegar no final de semana ou feriados apresentar um consumo de alimentos fora da sua rotina, muito mais calóricos e em maior quantidade do que costuma consumir, compensando na comida aquela fome emocional, que está muita mais relacionada ao comportamento, ao desejo do que propriamente a fome física em si”, explica a nutricionista.
Lista de alimentos com nutrientes importantes
Tão importante quanto ao período do jejum em si é saber quais alimentos comer nas janelas de alimentação. Nosso corpo tem necessidade de nutrientes a cada pelo menos 26 horas. Luna Azevedo separa abaixo alimentos de cada grupo nutricional capazes de fornecer todos os nutrientes necessários para seu corpo, mas também não deixa de destacar a importância da individualidade para a prescrição dietética, tanto em relação ao comportamento alimentar quanto na composição corporal de cada indivíduo. Assim, também reafirma a necessidade do aumento na ingestão hídrica, principalmente de água (saborizada também vale) e chás (maçã, funcho, hortelã, alcachofra, dente de leão, gengibre), para a estratégia funcionar.
Vegetais verde-escuros: couve, espinafre, bertalha, rúcula, agrião.
Legumes: abobrinha, berinjela, couve-flor, brócolis, tomates, inhame.
Leguminosas: grão de bico, ervilha, lentilha, feijão.
Cereais: aveia, quinoa, arroz integral.
Frutas (de preferência, com baixo índice glicêmico): goiaba, framboesa, abacate, maçã verde, kiwi, ameixa.
Proteínas: sementes, oleaginosas, folhas verdes, quinoa, oleaginosas, tofu, espinafre.
“Alimentos antioxidantes e anti-inflamatórios são uma ótima escolha para complementar o cardápio, tais como: linhaça, chia, gengibre, gergelim, abóbora, brócolis, uvas, açafrão, azeite de oliva extravirgem, frutas cítricas e vermelhas. Uma dica é possuir uma folha de planejamento e lista de compras para dinamizar a adoção dessa estratégia”, aconselha Luna Azevedo.
Benefícios do jejum
- Melhor controle da glicose ;
- Diminuição da resistência à insulina;
- Redução dos níveis de insulina no sangue;
- Melhora da hipertensão;
- Diminuição da inflamação;
- Diminuição da cintura/gordura abdominal;
- Melhora da memória;
- Melhora das taxas de colesterol.
Contraindicações
- Pessoas acima dos 65 anos, especialmente se tiver alguma doença crônica;
- Diabéticos e hipertensos devem conversar primeiro com um médico;
Pessoas com hipoglicemia; - Se você tem baixo peso, está grávida ou amamentando;
- Se você tem ou já teve transtornos alimentares.
No caso das gestantes, um estudo realizado em 2014 pela University of Manchester demonstrou que o jejum intermitente pode ter impactos profundos sobre o desenvolvimento fetal e placentário, já que ocorre comprometimento no transporte placentário de aminoácidos, interferindo no crescimento fetal. Já nas pessoas com diabetes tipo 1 insulino, o jejum também não é indicado, pois há tendência para a hipoglicemia; enquanto que para pessoas com baixa reserva de gordura e baixa massa muscular sem treino de força, o jejum pode promover a perda de massa magra.
Em geral, muito tempo de jejum, principalmente sem o acompanhamento de um profissional adequado, pode prejudicar os enterócitos e microbiota intestinal. Alguns riscos quando não adotado corretamente são a desidratação, hipoglicemia, ansiedade, fraqueza, mudança de humor, piora da qualidade do sono, enjoo, baixo rendimento na atividade física de resistência e força, aumento da fome, desconforto intestinal; ganho de peso, necessidade de suplementação de vitaminas e minerais para correção de possíveis desequilíbrios/carências nutricionais.
Já na outra ponta, quando bem realizado, os principais benefícios do jejum intermitente estão ligados à redução e controle de peso, perda de gordura corporal, diminuição dos níveis de LDL colesterol (melhora do perfil lipídico), melhora do metabolismo da glicose, diminuição de substâncias inflamatórias (TNFα, IL-1β, IL-6) e redução do processo inflamatório. Há também a melhora da performance física em exercícios de endurance no qual o método atua melhorando a composição corporal do esportista. Vale lembrar que é preciso muito cuidado para praticar esportes em jejum. Há especialistas que afirmam que o exercício físico por si só já reduz o açúcar no sangue. Por isso, além de cada caso ser avaliado individualmente, evitando a prática sem orientação profissional, é interessante nunca começar o exercício de barriga vazia. Caso não queira “furar o jejum”, ingerir líquidos como café, chá verde, ou até mesmo uma proteína, podem ser manobras que não afetam o jejum e dão base para o bom rendimento físico.
Fonte: G1.globo.com