Por que o frio pode matar? Entenda a hipotermia

Conheça as causas, os sintomas e as maneiras de prevenir a perigosa queda da temperatura corporal que pode ocorrer no inverno.

O frio pode matar o ser humano de hipotermia – queda acentuada e perigosa da temperatura corporal, abaixo dos 35 °C, nível necessário para o bom funcionamento do organismo. Entenda o que é a hipotermia, quais são os sintomas, como é causada e como evitá-la.

(Imagem Ilustrativa de Filip Mroz por Unsplash)

O que é hipotermia

Hipotermia é a queda acentuada e sustentada da temperatura corporal, o que causa prejuízos ao funcionamento do organismo e pode levar à morte.

“A única causa da hipotermia é a longa exposição ao frio intenso. Ou seja, quando o ser humano se encontra em ambiente com temperaturas muito baixas. Este estado acontece porque o corpo humano libera mais calor do que consegue reter, resultando na diminuição da temperatura corporal”, explica a cardiologista Mariana James, especialista em Medicina Integrativa.

Se não é rapidamente tratada, a hipotermia é capaz de levar à morte devido a uma série de malefícios causados pelo frio no corpo.

Confira a sequência de acontecimentos possíveis em decorrência da hipotermia, segundo o fisiologista Alex Evangelista:

  1. Desaceleração do metabolismo: com a diminuição da temperatura corporal, o metabolismo diminui, o que pode resultar em uma redução na produção de energia e calor. Isso pode levar à fadiga e à diminuição da capacidade do corpo de gerar calor para se manter aquecido;
  2. Disfunção do sistema nervoso central: a hipotermia pode afetar o funcionamento do sistema nervoso central, resultando em confusão, sonolência, falta de coordenação e perda de consciência. Em casos graves, pode ocorrer coma;
  3. Comprometimento da função cardiovascular: o frio extremo pode levar à vasoconstrição, ou seja, ao estreitamento dos vasos sanguíneos periféricos, o que reduz o fluxo sanguíneo para os órgãos vitais. Isso pode causar hipóxia (baixo teor de oxigênio) nos tecidos, incluindo o coração e o cérebro, podendo levar a arritmias cardíacas e até mesmo a parada cardíaca;
  4. Coagulação sanguínea anormal: a hipotermia pode interferir na capacidade do sangue de coagular adequadamente, aumentando o risco de hemorragia interna e externa;
  5. Falência de órgãos: à medida que a temperatura corporal continua a cair, os órgãos vitais, como o coração, os pulmões e os rins, podem falhar devido à redução da atividade metabólica e ao suprimento inadequado de oxigênio e nutrientes.

Sintomas da hipotermia

Conforme a cardiologista, se a temperatura corporal estiver de 33 °C a 35 °C, os sintomas decorrentes são considerados “leves”: tremores, mãos e pés têm menor circulação sanguínea e apresentam dormência, cansaço excessivo e lentidão nos movimentos.

Se a temperatura do corpo desce de 30 °C a 33 °C, os tremores passam a ser mais intensos e incontroláveis, a pessoa apresenta dificuldades para falar e controlar os movimentos do corpo e a frequência cardíaca e respiratória diminui bruscamente.

Se a temperatura estiver abaixo dos 30 °C, há o descontrole dos membros inferiores e superiores, a perda dos sentidos, a dilatação das pupilas e a pessoa que se encontra nesta situação tem a respiração seriamente comprometida, com risco de parada cardiorrespiratória e inconsciência.

“A hipotermia faz com que a velocidade dos batimentos cardíacos diminua e, por isso, é perigosa, pois o coração pode parar. Ela afeta os órgãos vitais, como o coração e o cérebro, uma vez que há falta de irrigação sanguínea”, explica a especialista.

Sintomas da hipotermia:

  • Tremores intensos
  • Fadiga
  • Confusão mental
  • Respiração rápida
  • Náusea
  • Sonolência
  • Falta de coordenação
  • Pele fria e pálida
  • Pulso e respiração fracos
  • Perda de consciência
  • Morte (em casos extremos)

O que causa hipotermia

“Existem situações que podem levar à hipotermia, como ficar com pouca proteção, como casaco, gorro e cachecol em regiões frias, com temperaturas próximas do zero ou pouco abaixo de zero; ficar em água fria por muito tempo e se expor a ventos excessivos. O vento excessivo em áreas frias piora a perda de calor, tornando-a mais intensa. Por exemplo, um paciente com o corpo molhado e/ou roupas molhadas, em um local que venta muito, vai perder mais calor e o organismo vai ter que trabalhar mais para manter uma temperatura corporal ideal”, destaca a médica clínica Glaucia Oliveira Lima, especialista em urgência e emergência.

Embora estudos indiquem que bebês, idosos e indivíduos com problemas endócrinos sejam mais propensos à condição, a hipotermia pode atingir todos os perfis de pessoas.

Ela ocorre por exposição prolongada a frio intenso, mas certos medicamentos, como antidepressivos, antipsicóticos e sedativos, podem mudar a capacidade do corpo de regular a temperatura, conforme a cardiologista.

Existem diferentes condições individuais que afetem a capacidade de tolerar o frio:

  • Composição corporal: pessoas com mais gordura corporal tendem a ter uma melhor capacidade de isolamento térmico e, portanto, podem ser mais tolerantes ao frio. Por outro lado, indivíduos com menos gordura corporal podem sentir mais frio, pois têm menos isolamento natural;
  • Metabolismo basal: o metabolismo basal, que é a taxa de queima de calorias em repouso, pode variar entre indivíduos. Pessoas com metabolismo mais rápido podem gerar mais calor internamente e, portanto, podem ser mais tolerantes ao frio;
  • Condicionamento físico: indivíduos que estão em melhor forma física podem ter uma melhor circulação sanguínea periférica e uma capacidade cardiovascular mais eficiente, o que pode ajudar na regulação da temperatura corporal e na tolerância ao frio;
  • Experiência prévia: pessoas que estão acostumadas a temperaturas mais frias podem desenvolver uma maior tolerância ao frio ao longo do tempo, devido a adaptações fisiológicas e comportamentais;
  • Genética: as diferenças na tolerância ao frio, em estudo, podem ter uma base genética, com certos genes influenciando a capacidade do corpo de regular a temperatura interna e responder ao estresse do frio.

“Outros aspectos como idade, sexo, saúde geral e condições ambientais também podem desempenhar papel na tolerância individual ao frio. Em geral, a capacidade de uma pessoa de tolerar o frio depende de uma interação complexa entre vários fatores biológicos, fisiológicos e ambientais”, completa o fisiologista.

Segundo Alex, na tentativa, por vezes desesperada, de regular a temperatura interna em resposta ao frio intenso, o corpo humano emprega mecanismos biológicos, como:

  • Termogênese: aumento da produção de calor pelo metabolismo celular, especialmente nos músculos e no fígado;
  • Vasoconstrição: redução do fluxo sanguíneo para pele e membros, conservando o calor nos órgãos vitais;
  • Tremores: movimentos involuntários dos músculos esqueléticos para gerar calor;
  • Pilomotor: arrepios, que fazem os pelos ficarem eriçados, criando uma camada isolante de ar ao redor do corpo;
  • Aumento da atividade metabólica: o corpo pode aumentar a atividade metabólica para gerar mais calor;
  • Aumento da produção de hormônios: a glândula tireoide pode aumentar a produção de hormônios, como a adrenalina, para estimular a termogênese e a vasoconstrição.

“Estes mecanismos trabalham em homeostasia (em sinergia) para controlar a temperatura fisiológica. Todavia, a capacidade do corpo humano de manter a temperatura interna varia de pessoa para pessoa. Existe uma combinação de temperatura e tempo de exposição que pode levar a condições perigosas, como hipotermia. De forma geral, a exposição prolongada a temperaturas abaixo de 0 °C sem proteção adequada pode levar à perda de calor mais rápida do que o corpo consegue gerar, resultando em hipotermia”, detalha Alex.

Como evitar a hipotermia

Quando está prevista a exposição a ambientes de frio extremo, o jeito é evitar a diminuição da temperatura corporal. Para isso, é necessário agasalhar-se adequadamente, com vestimentas apropriadas para a temperatura ambiente.

“E se houver contato com a água gelada, é necessário tirar a roupa úmida ou molhada, enrolar-se em cobertor e abraçar uma pessoa que esteja com a temperatura normal, já que contato físico também aquece. O objetivo dos primeiros cuidados é contar com fonte externa de calor para se reaquecer”, completa a cardiologista.

Em casos de hipotermia leve, com a manifestação apenas de tremores de frio, a recomendação da médica é agasalhar e ingerir alimentos quentes, como sopa ou chá. Porém, se a temperatura não começar a se elevar e o indivíduo piorar, apresentando confusão mental, por exemplo, a orientação é buscar atendimento médico imediatamente.

Quando detectada uma hipotermia, o paciente deve ser internado em uma unidade de emergência o mais rápido possível. Segundo Glaucia, no protocolo de atendimento do paciente, além do aquecimento corpóreo externo, pode ser feito infusão endovenosa de soro fisiológico aquecido.

“Esse soro deve ser aquecido a 40ºC. Podemos fazer oxigenioterapia por cateter aquecido. Hipotermia é um tema que muitos médicos que trabalham em emergência têm pouca experiência no Brasil, e é importante ter atenção ao diagnóstico”, ressalta a especialista.

Fontes:

Alex Evangelista (@alexevangelista55) é fisioterapeuta, fisiologista esportivo, com experiência em futebol, basquete, tênis e MMA. Em 2016, integrou a equipe campeã olímpica no futebol masculino. É autor de dois livros, incluindo um sobre recuperação muscular (Reabilitação acelerada: mitos e verdades), e criador do Centro Avançado de Prevenção, Reabilitação e Rendimento Esportivo (CAPRRES) quando trabalhava no Clube de Regatas Vasco da Gama.

Mariana James é cardiologista, especialista em Medicina Integrativa do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais). Graduada em Medicina pela Fundação Técnico Educacional Souza Marques, tem residência médica no Hospital Naval Marcílio Dias, com especialização em Cardiologia , Ecocardiografia e Medicina Integrativa.

Glaucia Oliveira Lima é médica e professora de Urgência e Emergência na Universidade São Judas Tadeu.

Fonte: EuAtleta